domingo

Edward Mãos de Tesoura




Tim Burton também tem seu tesourinho pra trilhar seus filmes. O Nome dele É Danny Elfman.

O moço tem brilho. Suas composições, tão oníricas quanto os filmes que trilha, nos levam aos braços de anjos rumo aos céus e às trevas. Pura magia, caixinha de música onde a bailarina sempre dança sozinha, uma taça de cristal repleta de lágrimas e outra, de veneno.

Ele é o cara do Oingo Boingo, veja só. Influenciado por Nino Rota, outro dos meus tesourinhos, ele trilhou TODOS os filmes do Tim Burton, entre outros e séries de TV.

Das trilhas do Tim, as que mais gosto são Peixe Grande, A Lenda do Cavaleiro sem cabeça e Edward Mãos de Tesoura, minha preferida.

Esse filme é de uma beleza que dói. cada tomada, cada biquinho que o Edward faz, são de partir o coração. Meio gente, meio tesouras, ele é puro amor e inocência. Parece uns meninos que eu conheci no Madame Satã.

Sempre fui admiradora da beleza estranha, do manco, do dente torto, da cicatriz, do tímido. Edward chega a ser pueril em suas lembranças, sua forma de amar e querer agradar. O amor pelo pai e a dor por sua morte fazem dele tão ou mais humano que todos nós. Tem aquele buraco que nenhum ser humano irá preencher: o buraco causado pelo abandono. Porque a gente nasceu pra ter carência já que aqueles que nos puseram no mundo não nos disseram que seria assim. Ninhuém devia nascer pensando que um dia pertenceu ou pertence ou pertencerá a alguém. O ser humano é um ser do mundo. A gente nasce e morre sozinho e esse devia ser o maior orgulho de viver, que só tem consciência aqueles que entendem que a pessoa mais importante da nossa vida somos nós mesmos.

Eu não sou eu, não sou teu e nem sou meu. Sou do mundo, que me acolhe e me estapeia. Do mundo, que me dá gosto e desgosto. E é assim que tem que ser porque nada é absoluto. O prêmio é voltar pra casinha sãos e salvos e lembrar que não há melhor lugar que o nosso lar, o lar interior, dentro do peito, dancing with myself.

Mas ter sempre alguém por perto é fundamental, sem posse, porque isso não é dependência, é alimento pra alma. cercar-se de quem é o bem e te quer bem é o maior e o melhor alimento pra alma. e tenho dito.

Edward, querido, bem vindo à vida real. Mas não fica sozinho não. Alguém vai gostar de você exatamente como você é. Mesmo que seja eu.





Quase Famosos




Que bom que essa trilha acabou de chegar aqui, no meu Toshibão.


Não haveria melhor momento para escutá-la. Dia nublado, chove lá fora e eu aqui, me chama, me chama, me chama...

Tem vezes que eu preciso do ar da graça dos 70's. Adoro ouvir músicas que eu ouvia em casa, que meus pais botavam na vitrola num dia chuvoso.

Quase Famosos, o filme, assisti faz tempo. Com meu pai, aliás. O doidão. Delícia de filme.

Adoro o Cameron Crowe e ele adora retratar gerações e os comportamentos e canções que envolvem suas tribos. Foi assim em Singles e, se você pensar bem, em Vanilla Sky também.

Eu tava aqui, agora que aquela maldita dor de cabeça passou, enfiada na leitura de coisas do Freud, teorias da personalidade e afins, o nariz já marcado pelo óculos, ouvindo Sophia Malman (que também é perfeita nos dias de outono-pq se for no inverno dá pra cortar os pulsos) e pensei: cara, preciso de uma pausa. Que será que chegaram as músicas que botei pra baixar?

Tava fuçando torrents de trilhas e, sem querer, vi a de Always Famous e dei um enter.

Porra, que delícia!

Lembrei súper do filme, que fala do jornalista mirim que é recrutado pela Rolling Stones pra fazer uma matéria da banda de rock top do momento. E tem aquela coisa de moleque conheccendo o mundo, a música, as drogas, as garotas, os dramas e as belezas da vida na estrada, sem rumo, sem dono. Ah, os 70's, né. Aquela coisa.

Mas ouvir a trilha hoje foi tão gostoso quanto quando eu tinha uns 15 anos e queria sentir a sensação do que é bucólico, do que é solidão, do que é o conforto da solidão. E passava uma tarde inteira de outono sentada na escadaria do Teatro Municipal, com minhas calças rasgadas e minha camisa xadrez fumando cigarro e observando tudo, sempre observando, naquele cenário cinza que é o centro de sÃo Paulo, principalmente no outono.

E hoje eu acordei e pensei que esses dias me senti como uma adolescente boba, quando vi ele na frente do bar, sexta-feira agora, e não soube o que fazer. Aquele cheiro atrás da orelha, o abraço, o beijo na trave e o sorriso que me deixou totalmente desconcertada, morrendo de vergonha porque minhas pernas tremiam e eu não queria que ele percebesse. E dei as costas depois de falar alguma coisa sem a menor criatividade, tipo "você já tocou?, porque eu tava morrendo de vergonha, com vergonha de ele me ver corar ou ouvir as batidas do meu coração. Que boba, me senti uma boba. Ainda mais porque não parecia uma boba, parecia uma pessoa blazé, dessas que eu odeio, que passam a noite com você e quando te vê de novo finge que não foi nada. Quem dera não ter sido nada. Não, ainda bem que foi tudo, mas agora eu não sei o que eu faço com as lembranças de uma manhã emendada numa tarde de dormir e acordar entre beijos, carinhos e sussurros, saliva e suor, sem pressa, sem vergonha, sem pretensão além de passar um momento ótimo e honesto, o cheiro que não sai do lençol e a imagem daqueles olhos cinzas que sorriem como os de crianças.

E aqui, tocando That's the way, do Led, me faz sentir um grande conforto. Porque apesar das minhas reações estúpidas de uma pessoa que na frente de um par de olhos cinzas, quase cava um buraco pra entrar de tão tímida, eu penso que estou hoje exatamente onde eu queria estar.

Estou à flor da pele, sentindo que o pulso ainda pulsa, que o coração sangra, que a cabeça dói e tudo isso é incrível, porque passei tanto tempo num torpor existencial, querendo mais, querendo viver o âmago da vida e sem viver e nem saber até.

Na trilha também tem uma música do Cat Stevens (The Wind) que eu adoro, tem Allman Brothers Band, puro roquenroll bem do jeito que eu gosto, tem Feel Flows do Beach Boys que é pura viagem com flautas maravilhosas, tem Thunderclap Newman, Simon and Garfunkel, e Todd Rundgren no melhor estilo antena um(este último principalmente). Não posso negar minha paixão pela Antena1 FM. Careta pra caramba, tem o tipo de música que me conforta na hora certa. É mais ou menos como aquelas músicas que a gente elege pra dormir, tipo Yo La Tengo, Gustavo Santaella e AIR.

Agora, com medo do que vou descobrir, vou voltar pras teorias de personalidade e talvez achar de onde veio essa minha súbita timidez que me invadiu quando os olhos cinzas olharam os olhos meus.

Deixo aí o Clarence Carter, só porque hoje eu vou dormir bem. Só comigo, mas muito bem.





quarta-feira

Bastardos Inglórios


Sempre que começa um burburinho de que tem filme novo do Tarantino rolando, a primeira coisa em que penso é: Oba! Tem trilha sonora das boas e sem dúvida vai ter Ennio Morricone!!

Adooooro os filmes do Tarantino e tanto quanto as trilhas que ele escolhe. Eu casaria com ele só pra passar a lua de mel ouvindo Ennio Morricone (exageraaaada...). Pra quem não sabe tem dele em todos os filmes do Tarantino (as do Kill Bill ficaram mais famosas), trilhou The Good, The Bad, The Ugly, Cinema Paradiso lindamente, Malena (perfeitoo), Era Uma Vez No Oeste...

Mas então, Bastardos Inglórios é totalmente do caralho. Os judeus matando os nazi à paulada, a heroína, magnífica e com um figurino impecável se chama Shosanna, Eli Roth foi a escolha perfeita, assim como Christopf Waltz.

Dá pra sacar como ele evoluiu como diretor. Tudo o que sempre foi bom está ainda melhor, com muito mais qualidade. Cenografia, iluminação, figurino, tomadas fudidas. Claro, parece que o orçamento foi maior também, isso ajuda, mas o cara tá fera.

Bradi Pitt, putz, não preciso nem falar mais nada. Depois que o vi no último dos irmãos Coen, já tava pagando um pauzão pra ele, mas agora...o cara mandou bem demais.

O roteiro é sensacional, puta idéia que, bravamente, deixou a academia sem jeito na indicação ao Oscar. Pra Tarantino isso é a glória, óbvio.

Agora, falando do que eu mais gosto: tem quatro faixas do Ennio Morricone(é a terceira vez que falo desse cara, mas, convenhamos, ele é demais) maravilhosas, tem David Bowe com Cat People, Jacques Loussier, The Film Studio Orchestra fabulosa, tem Billy Preston (Billy Preston!!!). Enfim, vou passar um tempo ouvindo!

E adivinha o que eu deixo pra vocês...






terça-feira

Amarcord (almoço entre amigos parte I)




Saudades daqueles domingos em que reuníamos amigos em casa para fazer um almoço, abrir um bom vinho e assistir algum filme cabeça.

E eu, que adoro trilhas sonoras para filmes e para minha própria vida, tinha sempre as minhas seleções para ocasiões especiais: seleção para ouvir na banheira, seleção pra transar, seleção pra dormir, seleção pré balada... A mais famosa ficou sendo a seleção "almoço entre amigos". Sempre muito elogiada, conta com scores de filmes e séries que adoro como Amélie Poulan, O Carteiro e o Poeta, Cinema Paradiso, Dexter, Diários de Motocicleta, Bicicletas de BelleVille, Amarcord, entre outros.

Hoje vou falar de Amarcord. Filme exuberante e encantador de Fellini, mostra a Itália dos aos 30, loucuras, bordéis, Mussolini e muitos elementos de outros filmes e da própria vida do Fellini, por se passar na cidade onde ele nasceu e integrar diversos elementos de sua infãncia, mistura cores e imaginação extremamente fértil através d o olhar de um garoto.

Absurdamente perfeitamente trilhado por Nino Rota, tem um dos scores que eu mais gosto de ouvir, principalmente durante agradáveis almoços entre amigos.

Nino Rota é geninho da música, consagradíssimo na Itália, começou a compor ainda criança. Responsável por 11 dos 15 scores de Poderoso Chegfão 2 - trilha premiada pelo Oscar - também trilhou Le Notti Bianche, La Dolce Vita e 8 1/2 (realmente ele encaixa direitinho com Fellini).

Música é mesmo do caralho. Sabe o que é mais curioso? Assisti Amarcord quando era bem pequena, pequena ao ponto de, depois de grande, não lembrar de mais uma cena sequer do filme. Mas nunca esqueci das músicas.

Um dia, tava comendo uma pizza na casa da Tati e ela colocou Amarcord, a música, pra tocar. Mil lembranças da minha infância voltaram aos meus olhos e pensava em nado sincronizado, Chanel n. 5, mulheres de chapéu em bailes no navio, até cenas do seriado Ilha da Fantasia(aquele do Tatu, lembra?) surgiam à minha frente. No dia seguinte tava lá, eu, vendo o filme de novo. Puro deleite.

Música é como cheiro: traz lembranças até do que a gente não viveu.





Closer




Assisti esse filme duas vezes e nas duas uma frase ficou na minha cabeça: "Por que o amor não é suficiente?". A personagem da Natalie Portman pergunta isso pro personagem do Jude Law na última vez em que eles se separam (ele se vai, na verdade). Isso me doeu tanto porque eu sempre pensei que "fundamental é mesmo o amor", mas de uma hora pra outra, o amor se transforma em mil e uma outras coisas e, mesmo sendo fundamental não é suficiente.

Um tempo atrás falei muito sobre o amor numa postagem sobre o filme Juno. É tão bom ter alguém que te faz pensar que fundamental é mesmo amor, alguém que te faz pensar que vocês dois são os personagens principais da sua história e que tudo e todos ao redor são o enredo e o cenário da história cujo curso são vocês que decidem e vai ter sempre um final feliz se houver amor, mas infelizmente não é bem assim. Às vezes só o amor não basta. Não basta porque o amor que a gente sente por nós mesmos tem que ser maior. Senão a gente vive dando o que não tem e pedindo o que não podem te dar.

Um amigo caiu do céu dia desses na minha cabeça e me fez voltar a pensar em coisas que eu estava empurrando pra baixo do tapete. Coisas que não têm explicação mas que não se pode deixar de pensar. Qual a medida do amor? Dá pra saber se há amor o suficiente para um relacionamento durar pra sempre? Pode um relacionamento durar pra sempre? As pessoas que envelhecem juntas apenas se acostumam umas às outras? Por que a gente não quer mais estar com alguém insubstituivel? Por que a gente prefere ficar sozinho à estar com a pessoa perfeita? Por que partir se ainda existe amor? Por que o amor não é suficiente? Por que só o amor não traz felicidade? E a pior das perguntas: por que não há explicação para todas essas perguntas?

Eu procuro encontrar consolo mais uma vez na máxima taoista de que nada é absolto. Que só há evolução no caos. Porque só pode ser uma grande necesidade de crescimento pra me fazer acreditar que tudo pode ser ainda melhor, mesmo que pra isso a casa caia.

Não basta amar: tem que saber amar. Tem que saber que você é a pessoa mais importante da sua própria vida e não relevar tanto tanto seu amor próprio em detrimento das necessidades do outro. O ser humano é um poço sem fundo e é assim porque tem fome. Tem fome do buraco de onde veio, do ventre da mãe insubstituível e tem fome porque a existência parece ser um fardo a ser carregado. Essa fome causada pelo abandono que é o nascimento existe porque a gente vive cercado de medo, de culpa e de apego. Medo de ficar sozinho, culpa por deixar a nossa felicidade sob a responsabilidade de outra pessoa e apego pelo outro em detrimento da nossa liberdade individual.

Eu tenho que entrar no mais profundo do meu ser pra enxergar o que só se pode ver na escuridão: meu próprio eu, que há tanto tempo se perdeu tentando se encontrar. Enquanto isso, eu vivo de luto, porque ainda não consegui transgredir o limite da mudança. Não consegui ainda aceitar que o que eu mesma escolhi deixar pra trás tem que ficar lá atrás e o agora é o dia mais importante da minha vida. Ainda não assumi que eu sou e estou aqui e agora. Mas esse dia vai chegar em breve. Preciso primeiro me livrar do medo, da culpa e do apego pra me sentir menos abandonada por mim mesma e fechar minha Gestalt.

Pra ouvir, nada de Damien Rice. fico com o Nando Reis, que descreve tão bem os sentimentos.

"Tornar o amor real é expulsá-lo de você pra que ele possa ser de alguém"


Chega de Saudade




Preciso começar logo as aulas de dança de salão pois já sei bem que quando estiver velhinha é na pista que vou me divertir.

Assisti esse filme no final do ano passado, numa fase difícil com mil e uma mudanças me assombrando e tava sensível pra caramba.

Foi bacana porque é um filme sobre relacionamentos, sobre o passar do tempo, sobre escolhas. Coisas que eu estava vivendo, no meu processo de mudanças, naquele momento.

Fala de um casal cujo relacionamento parece abalado pela intimidade da rotina que faz a gente esquecer que o outro tem um brilho no olhar que não pode morrer. Faz a gente esquecer que o respeito está nas pequenas coisas e o bem querer, o carinho e a gentileza também. Faz a gente esquecer que o mundo tá cheio de oportunidades, tá cheio daqueles que ainda enxergam o brilho que a gente tem no olhar, mesmo num olhar de ressaca, mesmo num olhar mareado, um riscado por um grão de sal.

E a mocinha do casal se vê no último lugar onde ela esperava encontrar outros tantos casais, feitos, desfeitos ou simplesmente pessoas à procura de amor, de emoção, de sexo, de parceria ou qualquer outra coisa que preencha a lacuna que o tempo um dia vai deixar ou já em todos nós: a solidão.

E o baile da saudade é simplesmente a vida pulsando por todos os poros, em lembranças, em afagos, em declarações de amor e de ódio, em confissões, em doenças, em máguas, em pesares, arrependimentos, desalentos, paixões avassaladoras, sorrisos, galanteios, furacões de emoção e a plenitude do amor.

Este é um filme dirigido por Laís Bodanzky, que também fez Bicho de Sete Cabças (cuja trilha também é ótima - ainda vou comentar) que me aqueceu o coração e me encheu de vontade de me matricular em aulas de dança de salão.

A trilha é tão bacana que foi lançada antes do filme pra já ir esquentando a galera. O roteirista Luiz Bolognesi conta também que primeiro trilhou o filme e depois foi pensar no elenco, na cenografia e tal.

A trilha ficou por conta do produtor musicalBiD, que fez uma longa pesquisa de campo pra saber o que o pessoal da terceira idade dança nesses clubes e descobriu que o repertório além de amplo é bem atual, como dá pra conferir no filme.

O toque de midas fica por conta das participações fundamentais de Elza Soares e Marku Ribas como cantores da banda Luar de Prata, arrasando em versões de "Mon Amour, Meu Bem, Ma Femme", "Mulheres", "Você Não Vale Nada", "Cha Cha Cha" e por aí vai.

Tem samba, bolero, forró, gafieira, soltinho, samba-rock, salsa e tango pra ninguém ficar parado. Tudo isso embalando histórias e flash backs do personagens que fazem da mocinha uma espectadora da vida como ela é e a faz acreditar que a vida como ela é é ainda muito mais do que ela pode ser.

É sério: se joga nessa e não vai se arrepender.